
Dados mais recentes divulgados pela Secretaria do Estado de Justiça e Reintegração Social (Sejuri) apontam o perfil médio do apenado do sistema prisional catarinense. Ele é homem, branco, solteiro, tem de 21 a 30 anos de idade. Além disso, é católico, possui ensino fundamental incompleto, mas acabou por se envolver, majoritariamente, com tráfico de drogas, roubo, furto ou homicídio e foi parar atrás das grades.
O juiz Rafael de Araújo Rios Schmitt, cooperador técnico e coordenador do Grupo de Monitoramento e Fiscalização dos Sistemas Prisional e Socioeducativo (GMF) do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, considera as características similares àquelas verificadas no padrão nacional. Os dados, em sua avaliação, não chegam a surpreender. “Em todo o Brasil, o perfil mais comum do apenado é de um homem jovem, entre 18 e 30 anos. Com baixa escolaridade e origem em contextos de vulnerabilidade social”, compara. Crimes como tráfico, roubo e furto, acrescenta, lideram as estatísticas de encarceramento em todo o país.
Os dados divulgados revelam, como um raio-x, diversos extratos da população que habita penitenciárias e presídios em território catarinense. O sistema prisional de Santa Catarina, integrado por 54 estabelecimentos penais, segrega atualmente 28.858 detentos. Para se ter ideia, esse contingente supera a população de 141 dos 295 municípios catarinenses.
Com exatidão, segundo dados do censo do IBGE de 2022, a população prisional ocuparia a 54º posição entre as cidades do Estado no quesito habitantes, atrás de Garopaba (29.959 habitantes) mas logo à frente de Maravilha (28.251 habitantes).
Crimes violentos dominam
Nesta cidade de ficção, as estatísticas, algumas destoantes, outras congruentes, ajudam a traçar o perfil daqueles que foram condenados por infringir a lei em Santa Catarina. Somente oito crimes são responsáveis por manter atrás das grades mais da metade dos homens e mulheres atualmente recolhidos aos presídios e peniteniárias catarinenses. São mais de 14 mil apenados com condenação por tráfico e associação para o tráfico de drogas (18,3%), roubo (9,62%), furto (7,18%), homicídio (6,53%), estupro (3,56%), receptação (3,11%) e organização criminosa (2,90%).

O fato de um terço dos internos ter cometido crimes como tráfico ou roubo, admite o juiz Rafael Rios, traz preocupação às autoridades, porque revela inclusive um contexto fora do cárcere de expansão das organizações criminosas. Por outro lado, pondera, também aponta para um cuidado das forças de segurança pública e do sistema de justiça com o tema. “O Tribunal de Justiça de Santa Catarina, por exemplo, acaba de criar a Vara Estadual de Organizações Criminosas”, exemplifica. Na leitura do magistrado, a concentração de homens e mulheres presos envolvidos em crimes violentos traduz-se em ponto sensível para a Secretaria de Estado de Justiça e Reintegração Social. Porém, afiança, a secretaria trabalha em conjunto com os demais órgãos de segurança para diminuir os impactos negativos dessa realidade.
Babel do crime
São 23 nacionalidades presentes no sistema, em convivência com catarinenses e brasileiros de outras 25 unidades da federação – só não estão representadas pessoas de Tocantins e Roraima. As ondas migratórias influenciam também os presídios. Venezuelanos são maioria neste momento, ao lado de paraguaios, argentinos, uruguaios e haitianos. Somados, contudo, não chegam a 0,70% do total, ou menos de 200 apenados. O rol de estrangeiros faz pensar em como e por quê cada um deles está preso em Santa Catarina. Além dos já citados, há cidadãos da Colômbia, Chile, Peru, Bolívia, Guatemala, Costa Rica, Cuba, Bahamas, Estados Unidos, Itália, Espanha, Inglaterra, Alemanha, Portugal, Líbano, Marrocos e Japão.
A babilônia prisional, contudo, aparece na estatística mas não chega a se enraizar no sistema. Não que se possa negar hoje a existência e atuação de organizações criminosas transnacionais, mas a realidade no Estado é distinta. “Pelo que temos visto nas inspeções do Grupo de Monitoramento e Fiscalização dos Sistemas Prisional e Socioeducativo, percebemos situações casuísticas em Santa Catarina. Por exemplo, presos de outras nacionalidades que não cometeram crime no Brasil e aguardam a extradição, em casos até envolvendo crimes tributários”, testemunha o coordenador do GMF/TJSC.

População penitenciária
As estatísticas permitem estudar ainda muitos outros recortes da massa carcerária. Na questão racial, a população carcerária é bem mais equilibrada, a partir da maioria branca (58,9%), seguida por pardos (30,6%) e pretos (8,4%). Ainda aparecem representantes da raça amarela (1,5%) e indígenas (0,6%). A faixa etária de homens e mulheres atrás das grades no Estado revela, por sua vez, que a maior parte deles encontra-se entre 18 e 40 anos. Período que as pessoas não privadas de liberdade via de regra ocupam espaço e se desenvolvem no mercado de trabalho. Juntas, alcançam 69,8% do total, que registra ainda apenados da terceira idade e até anciões. Individualmente, a faixa etária dominante é aquele composta por apenados entre 21 e 30 anos, com 35,9%.
O número da população em presídios e penitenciárias do Estado também exige reflexão das autoridades. O juiz Rafael Rios, conhecedor da matéria, não se furta em fazer uma análise acurada da situação neste momento. “Olhando os números brutos, vemos que Santa Catarina é o 10º estado mais populoso do Brasil e tem a 7ª maior população carcerária. Isso sugere uma taxa de encarceramento proporcionalmente alta. É um dado que merece atenção e estudo mais aprofundado, para entender as políticas criminais do Estado e avaliar se o encarceramento está sendo usado de forma adequada e eficaz”.
Solteiros, católicos e de pouco estudo
O estado civil da massa carcerária aponta para uma maioria de solteiros (57,6%), seguidos à distância por pessoas que vivem em união estável (24%) ou casados (12,1%). Também existem, em bem menor número, por ordem decrescente, separados, divorciados, viúvos e até desquitados – na verdade, estado civil que deixou de existir no país, substituído pela separação judicial e, posteriormente, pela Lei do Divórcio, em 1977.
A religião repete o quadro extramuros, com maioria católica (46,2%), seguido por evangélicos (23%). Representantes de credos afro-brasileiros, protestantes, espíritas, adventistas, testemunhas de Jeová, luteranos e budistas, juntos, representam 3,9% da massa carcerária. Aqueles que não informaram, nada professam ou possuem outros credos integram um segmento composto por 26,9% do total.
O nível escolar dominante é o ensino fundamental incompleto (38,09%), obrigatório para crianças de seis a 14 anos. Incompleto ou completo, os ensinos fundamental e médio dominam o cárcere. Juntos, representam 92%. Nas extremidades, alguns poucos representantes. São 2,79% apenados entre analfabetos, analfabetos funcionais e semianalfabetos; e 4,79% com nível superior incompleto ou completo, especialização e até mestrado. Contudo, entre eles, não há nenhum Doutor (PhD).
Sistema prisional catarinense
Para o presidente do Grupo de Monitoramento e Fiscalização dos Sistemas Prisional e Socioeducativo (GMF), desembargador Roberto Lucas Pacheco, os dados evidenciam uma realidade que precisa ser enfrentada com seriedade. “Temos uma população carcerária jovem, com baixa escolaridade e marcada pela vulnerabilidade social, fatores que facilitam o aliciamento pelo crime organizado. Essa realidade exige o fortalecimento constante do sistema de justiça e das forças de segurança, sempre com foco na reintegração social. Precisamos investir na educação dos nossos jovens como forma mais eficaz de reduzir a criminalidade, criando oportunidades legítimas e afastando-os dos caminhos do crime”, reforçou.