
Em Palhoça, na Grande Florianópolis, um artigo de uma lei municipal que restringe a educação racial nas escolas está na mira do Ministério Público. A 9ª Promotoria de Justiça da Comarca local questionou a legislação e emitiu uma recomendação exigindo a obrigatoriedade tanto nas escolas públicas quanto nas privadas de Palhoça.
Os promotores se baseiam nas Leis Federais nº 10.639/2003 e nº 11.645/2008, que determinam a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira, africana e indígena em todas as escolas, sejam elas públicas ou privadas. A orientação foi expedida para a Prefeitura da cidade, através de um inquérito civil que apura possíveis irregularidades no cumprimento das legislações federais mencionadas.
O MPSC tomou conhecimento de que o artigo 3º da Lei Municipal de Palhoça nº 5.370, de 27 de novembro de 2023, estabelece a obrigatoriedade do letramento racial apenas para as escolas públicas, tornando-o facultativo para as instituições privadas de ensino no município. Segundo a 9ª Promotoria de Justiça, essa disposição incorre em vício formal de inconstitucionalidade por contrariar normas gerais da União e complementares do Estado de Santa Catarina, extrapolando os limites da competência suplementar atribuída aos municípios pelo artigo 30, inciso II, da Constituição Federal.
Educação racial é Lei Federal
Além disso, o artigo municipal também apresenta vício material de inconstitucionalidade por violar tratado internacional de direitos humanos com status de emenda constitucional, sendo, portanto, incompatível com o ordenamento jurídico brasileiro.
De acordo com a Promotora de Justiça Giselli Dutra, a recomendação é para que o Município adote as providências legislativas necessárias para a revogação ou alteração do referido artigo da lei municipal, a fim de que o letramento racial sobre a cultura negra seja obrigatório em todas as escolas de Palhoça, independentemente de serem públicas ou privadas.

Para a Promotora de Justiça, a medida é um passo essencial para assegurar que todas as escolas de Palhoça, tanto públicas quanto privadas, cumpram as diretrizes legais e promovam uma educação inclusiva e igualitária. “Isso não só fortalece o cumprimento das leis federais e estaduais, mas também contribui significativamente para a formação de uma sociedade mais consciente e justa”, afirmou.
Competência de legislar cabe à União
A Constituição da República, no inciso XXIV do artigo 22, estabelece que compete à União legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional. Ou seja, compete exclusivamente à União o estabelecimento das normas gerais que estruturam o sistema educacional, excluindo dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios essa possibilidade. O Supremo Tribunal Federal (STF) também reconheceu a competência da União em legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional, cabendo aos Estados e Municípios apenas legislar sobre aspectos específicos da educação, desde que respeitadas as normas gerais estabelecidas pela União.
Na recomendação, a 9ª Promotoria de Justiça observa ainda que, no âmbito estadual, a Lei Complementar nº 170, de 7 de agosto de 1998, do Estado de Santa Catarina, impõe às escolas públicas e privadas a obrigatoriedade de incluir em seus currículos conteúdos relacionados à história e à cultura afro-brasileira, determinando ainda que a rede de ensino promova a formação específica de seus professores para a docência desses temas.
Prazos
A recomendação do MPSC é para que o Prefeito de Palhoça, no prazo de 30 dias, adote as medidas legislativas necessárias para revogar ou alterar o artigo 3º da referida lei municipal. O Município tem o prazo de 10 dias, a contar do recebimento, para informar se acatará ou não a recomendação. Caso não haja cumprimento, o MPSC poderá propor uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, além de adotar outras medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis para assegurar o cumprimento da legislação federal e dos direitos fundamentais envolvidos.
A Prefeitura de Palhoça até o momento não se manifestou a respeito.