
Após 14 anos de abandono, o prédio da antiga Escola Estadual Antonieta de Barros, no Centro Histórico de Florianópolis, irá finalmente passar por uma reforma para reabrir suas portas ao público. O local, que fica na esquina das ruas Victor Meirelles com Saldanha Marinho, vai se transformar num centro de Memória e Cultura. Um destino escolhido desde que as ruínas foram repassadas do Governo do Estado para a Prefeitura.
A ordem de serviço para início das obras será assinada numa cerimônia nesta sexta-feira (11), no pátio lateral da escola. A data, também marca os 124 anos de nascimento da professora, jornalista e política Antonieta de Barros.
A proposta é a de que o Centro de Memória e Cultura Professora Antonieta de Barros seja um centro agregador, formativo, difusor e de valorização dos aspectos culturais de origem africana e afro-brasileira. Além disso, vai abrigar atividades e elementos ligados à trajetória de vida e profissional de Antonieta.
Um ano para ficar pronta
A obra de reforma será comandada pela Secretaria de Infraestrutura e Manutenção da Cidade e executada pela empreiteira Litoral Engenharia e Construções. O total do investimento previsto é de R$ 4,4 milhões. Desse montante, R$ 4,1 milhões são provenientes do Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano. E outros quase R$ 400 mil disponibilizados através de emenda parlamentar da vereadora Carla Ayres. O prazo previsto para conclusão é de um ano.

A construção, que data da década de 1940, abrigou o Colégio Estadual Dias Velho, onde passaram destacados educadores catarinenses, incluindo Antonieta de Barros, que lecionou e foi diretora da instituição. Em 1952, após a morte da jornalista e primeira deputada negra eleita no Brasil, a escola ganhou o nome atual em sua homenagem.
No ano seguinte, o prédio foi cedido a uma fundação e se tornou um Colégio Cenecista, a partir de uma portaria ministerial em março de 1953, quando Florianópolis completava 280 anos. O prédio foi tombado como patrimônio histórico da Capital em 1986.
Coletivo Antonieta Resiste
Em 2004, a entidade que a administrava, chamada Campanha Nacional de Escolas da Comunidade (CNEC), devolveu o prédio ao Estado que manteve seu funcionamento somente até 2007.

A criação de um centro de memória e cultura negra de Santa Catarina naquele espaço vem sendo articulada há alguns anos pelo coletivo Antonieta Resiste, constituído por organizações, representantes da sociedade civil e de mandatos antirracistas.
A obra
A edificação da antiga escola estadual tem uma área total de 928,99 metros quadrados. Agora, a previsão é de obras de reforço e recuperação estrutural, e aperfeiçoamento das instalações complementares.
Internamente, entre os serviços previstos está o restauro da estrutura em concreto armado em geral do prédio e a retirada de uma escada construída após a inauguração da escola que descaracterizou o layout original. Também se prevê o restauro de pisos, forros, esquadrias e paredes, e substituição de toda a cobertura por uma laje impermeabilizada. Assim, terá também novas instalações elétricas, com construção de casa de medição para a nova entrada de energia com transformador em poste e preventivas contra incêndio e hidrossanitárias, com construção de reservatório d’água para consumo e reserva técnica de incêndio com casa de bombas. Além disso, também vai ser implantado um sistema de cabeamento estruturado, climatização e elevador voltado especialmente a pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida.

Externamente, haverá a reconstituição da fachada, a reforma e atualização da área de fora do edifício, paisagismo dos canteiros, e implantações de guarda-corpo nas escadas e de gradil sobre o muro de pedra, ambos de vidro.
O espaço cultural
À princípio, o Museu Antonieta de Barros vai ganhar vida no piso superior do edifício com livros, reproduções de cartas e de imagens, poemas, discursos, entrevistas e exibições de documentários relativos à essa personalidade tão marcante para a história de Florianópolis, de Santa Catarina e do Brasil. E vai contar com miniauditório – a exemplo do Museu de Florianópolis – para eventos.
Enquanto isso, o espaço do Centro de Memória, Cultura e Arte Negra Catarinense, no mesmo andar, vai ser destinado à valorização e trajetória de grupos sociais e indivíduos, e de práticas culturais negras no Estado. Nele serão expostos materiais considerados antigos e raros, reproduções de imagens e mostras de audiovisuais. Para tanto, ambos os ambientes serão estruturados com telas interativas, entre outros equipamentos. Além disso, o Centro de Memória e Cultura Professora Antonieta de Barros também terá uma sala com acervo permanente do artista e professor Franklin Cascaes, no que remete à arte e cultura negra.


Ainda neste piso, outras duas áreas prometem atrair a atenção dos visitantes. Afinal, o pátio interno deverá ser usado para exposições temporárias e itinerantes ou de acervo permanente e de comodatos, e o pátio externo para práticas culturais diversas como feiras, apresentações, ensaios, mostras, encontros, atos e rodas de conversas. Além disso, o andar contará com uma sala para reserva técnica.
O térreo do prédio, onde ficará a recepção ao público, contará com espaços voltados a ações culturais de curta e média duração como oficinas de dança, teatro, capoeira, práticas de leitura e formação de leitores, desenho, música; contação de histórias; lançamentos de livros; exibição de documentários e de outros gêneros de filmes, e debates públicos, entre outras. Esse mesmo piso ainda terá salas de apoio para guarda de equipamentos, banheiros públicos, e pequena cozinha e copa para os trabalhadores do lugar.
Vale ressaltar que todo o uso e ocupação desse edifício foi amplamente discutido entre o gabinete do prefeito e os coletivos sociais envolvidos nesse planejamento.
Antonieta de Barros
Em 2023, o nome de Antonieta de Barros foi eternizado no Livro de Aço dos heróis e heroínas nacionais do Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves, na capital federal, em Brasília.
Antonieta de Barros nasceu em Florianópolis no dia 11 de julho de 1901. Ela destacou-se por ter assumido uma das cadeiras da Assembleia Legislativa de Santa Catarina em 1935 como uma das primeiras mulheres eleitas e a primeira negra a ter um mandato popular no Brasil. No parlamento, foi ativa defensora da emancipação feminina e de uma educação de qualidade para todos, e autora do projeto de lei que criou o Dia do Professor e o feriado escolar que marca a data, no Estado, o que viria a ser oficializado em todo País somente 20 anos depois.
Antes disso, no entanto, Antonieta de Barros já era notável professora formada pela Escola Normal Catarinense. Fundou em 1922, na cidade natal, o Curso Antonieta de Barros, com o objetivo de alfabetizar pessoas sem condições financeiras — o qual dirigiu por 30 anos, até sua morte – tendo também lecionado Português e Literatura em importantes colégios de Florianópolis.
Já como cronista, escreveu mais de mil artigos em oito veículos e criou a revista Vida Ilhoa, e, em 1937, publicou o livro “Farrapos de Ideias”, cujos lucros da primeira edição foram doados para construção de uma escola para abrigar crianças filhas de pais internados no leprosário Colônia Santa Tereza.