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Atleta catarinense é a mais cara contratação do futebol feminino de Portugal

Filha de agricultores, Maiara Niehues, de Itapiranga, no Extremo Oeste, joga no Sporting de Lisboa

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Atleta catarinense é a mais cara contratação do futebol feminino de Portugal
Fotos: divulgação

A catarinense Maiara Carolina Niehues, de apenas 18 anos, se tornou a maior negociação da história do futebol feminino em Portugal ao se transferir do Internacional, de Porto Alegre, para o Sporting, de Lisboa, num contrato de três anos. O clube português desembolsou 30 mil euros, superando o recorde anterior, estabelecido na compra da portuguesa Ana Borges pelo mesmo Sporting junto ao Chelsea, da Inglaterra, há dois anos.

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A negociação foi intermediada pela agente Raquel Sampaio, fundadora da ​​​​​​​Teammate Football Management.

Maiara nasceu na comunidade de São Ludgero, na cidade de Itapiranga, no Extremo Oeste catarinense, a 718 quilômetros de Florianópolis. Filha de agricultores, desde pequena se destacou jogando futebol na escola, no campo da comunidade e em competições municipais, onde estreou pelo Clube de Futsal e Futebol de Campo Feminino de Base da Associação Concordiense de Futsal Feminino (Acoff), da cidade de Concórdia.

O talento da menina logo chamou a atenção do professor Amauri Giordan, na Chapecoense, que a levou para Chapecó. Em 2019, Giordan, que faleceu de Covid em 2021, emprestou atletas juvenis para representarem o Iranduba, de Manaus, na época um dos principais clubes femininos do Brasil, dirigido pelo gaúcho Lauro Tentardini. E foi no campeonato Brasileiro sub 16, até hoje disputado no formato de torneio curto, que Maiara despertou o interesse do Internacional, de Porto Alegre, um dos poucos clubes brasileiros que tratam o feminino com seriedade, sem interrupções, desde os anos 90.

No Inter, o futebol de Maiara ganhou projeção nacional e a catarinesne chegou às seleções de base. Foi no colorado gaúcho também que conqusitou o título dos brasileiros sub 17 e sub 20.

“Estou muito feliz por estar na equipe do Sporting, que é um grande clube português e aposta muito no futebol feminino. Assim que foi feita a proposta, soube logo que era este o caminho, seria esta a minha casa”, afirmou Maiara, que se apresenta como “Mai”.

“Vou ajudar a equipa com vontade de vencer e dedicação nos treinos e nos jogos. Tenho a certeza de que vou entregar sempre tudo dentro de campo”, afirmou, antes de traçar também as suas ambições. “Quero construir um capítulo da minha história no Sporting CP, ajudando o Clube a crescer cada vez mais e a evoluir a cada dia”, destacou.

Mídia de Portugal

A imprensa especializada de Portugal destacou as caracterísitcas da jogadora catarinense:

“Maiara tem um perfil de box-to-box. Tem muita chegada à área contrária, uma relação com bola muito interessante tendo em conta o perfil físico que tem e também bons índices de velocidade. Sabe usar o corpo para guardar a bola e é muito forte a ganhar metros em condução, uma das suas principais armas. Para além disso, apresenta boa visão de jogo e qualidade na execução do passe. Maiara Niehues não é uma jogadora “feita”, mas sim um projeto de jogadora. É preciso atentar ao facto de que tem 18 anos e provavelmente vai errar, mas precisa desse espaço para errar como parte do seu crescimento enquanto atleta. Apesar disso, é uma jogadora cujo rendimento atual já é muito interessante e capaz de marcar a diferença na Liga BPI. Olhando ao potencial, poderemos estar perante uma futura jogadora da seleção A brasileira”, publicou o jornalista português Daniel Sousa.

Maiara não é a primeira jogadora catarinense a desbravar novos caminhos no futebol feminino de Portugal. Em 2018, a goleira Dani Neuhaus, que cresceu em Santo Amaro da Imperatriz, desermbarcou no Benfica, principal time feminino daquele país. Mesmo tendo nascido em Campinas (SP), Dani veio com a família ainda criança para a Grande Florianópolis, onde ainda cedo migrou do vôlei para o futebol, e se destacou no extinto Veneno, time amador que deu origem ao Figueirense/Paula Ramos Futebol 7.

Em 2020, foi a vez de outra goleira, desta vez a manezinha Luiza Jesus. Após construir carreira no Figueirense com três títulos mundiais interclubes, passagens pela seleção de Fut 7 e um título de melhor goleira do mundo, Luiza trocou de modalidade e buscou oportunidades no futebol de campo. Sem conseguir jogar no Avaí/Kindermann, onde foi reserva de Bárbara, da seleção brasileira, Luiza iniciava um recomeço no Real Ariquemes, de Rondônia, quando a pandemia parou com o futebol em todo o mundo. Foi nesse intervalo que se transferiu para o desconhecido A-dos-Fancos, da terceira divisão de Portugal. Com boas atuações, Luiza subiu mais um degrau e se passou para o para o Atlético CP e no ano passado, após chamar a atenção de diversos clubes e atrair propostas, Luiza escolheu o Gil Vicente, da região de Barcelos.

Luiza Jesus

Outra catarinense que faz sucesso em terras portuguesas é a atacante Janaina Weimer, natural de Arabutã, que hoje é titular e artilheira no Racing Power, líder da segunda divisão e sensação na Copa de Portugal, onde vai disputar as semifinais em março. Formada na base do Criciúma, Janaina marcou 34 gols em 31 jogos na temporada passada. Desde que chegou no clube, em 2021, foram 56 gols em 53 jogos.

A zagueira Evelyn Schwarz, de 23 aos, natural de Concórdia, também fez sua base no Criciúma e chegou em Portugal em 2019, para jogar no pequeno Bonitos de Amorim. Depois, pasosu pelo Ouriense, onde nem chegou a jogar, e se transferiu para o Amora, onde ficou duas temporadas e foi para o Estoril Praia.

A sexta e última catarinense foi a meio campo Celiani Vieira da Silveira, de 23 anos, natural de Imbituba, que passou pelo Gil Vicente em 2021. Hoje não há informações sobre seu paradeiro, mas ela segue sem registro como profissional desde o ano passado.

Maiara, Luiza, Janaina, Evelyn, Dani, Celiani e tantas outras catarinenses precisam sair de Santa Catarina para buscar oportunidades no futebol. No estado em que nasceram, a modalidade ainda é tratada como subproduto. O único time na primeira divisão, Avaí/Kindermann, é fruto da fusão entre o extinto Kindermann, que se apagou após a morte do seu entusiasta Salézio Kindermann, e o Avaí FC, que buscou a parceria para atender uma determinação da Conmebol. Desde 2019, a entidade exige que clubes da série A do masculino mantenham um time feminino em atividade. Enquanto os homens oscilam entre o acesso à série A e o rebaixamento pora série B, como vem repetindo nos últimos 13 anos, o Avaí mantém o departamento feminino bem longe de casa. A promessa de campanha do presidente Julio Herdt de assumir o feminino como projeto e trazer a estrutrura para a Capital, segue apenas no papel.

Em Chapecó, a morte do professor Amauri Giordan em 2021 também provocou o desaparecimento da modalidade no clube. Em 2022, sequer disputou o campeonato catarinense, como vinha fazendo até o ano anterior. Em Criciúma, o trabalho de base da professora Sabrina Cassol, a Bina, tem forjado diversas jovens craques todos os anos, que nem chegam a fazer carreira no clube, atraídas por salários e contratos profissionais bem longe de casa. O Criciúma oferece apenas algumas poucas vagas de alojamentos, alimentação e convênio com uma faculdade, e ainda parece se orgulhar disso.

No Figueirense, a situação é ainda mais vexatória. Longe demais da série A do masculino, o clube nem se preocupa com a determinação da Conmebol, algo que só vai poder intrigar a diretoria quando o time voltar à elite do brasileirão. A equipe de futebol sete, que em poucos anos conquistou três mundiais e diversos titulos brasileiros, sobreviveu nesse período á base de rifas, vaquinhas e doações, sem nunca receber nenhum centavo do clube.

Em Joinville, o professor Ivens Fernando comanda um projeto social chamado AD 3R, que forma e exporta talentos para diversos clubes profissionais no Brasil. Apesar de estarem na mesma cidade, o EC Joinville, que há alguns anos disputava a elite do Brasileiro, parece nem tomar conhecimento da existência do projeto, e sequer ameaça colocar um time no estadual feminino.

Ivens Fernando

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